13 de set. de 2009

Bolo de Amoras


Acordei cedo. Colher amoras no quintal para preparar um bolo para o café da manhã me fez lembrar o Omelete de Amoras que o Walter Benjamin preparou para compartilhar sabores essenciais à vida.

Omelete de Amoras - Walter Benjamim

Esta velha história, conto-a àqueles que agora gostariam de experimentar figos ou Falerno, o borscht ou uma comida camponesa de Capri. Era uma vez um rei que chamava de seu todo poder e todos os tesouros da Terra, mas apesar disso, não se sentia feliz e se tornava melancólico de ano a ano.

Então um dia, mandou chamar seu cozinheiro particular e lhe disse: - Por muito tempo tens trabalhado para mim com fidelidade e tens servido à mesa os pratos mais esplêndidos, e tenho por ti afeição. Porém desejo agora uma última prova de teu talento. Deves me fazer uma omelete de amoras tal qual saboreei há cinquenta anos , em minha mais tenra infância. Naquela época meu pai travava guerra contra o perverso vizinho do oriente. Este acabou vencendo e tivemos que fugir. E fugimos, pois, noite e dia, meu pai e eu, até chegarmos a uma floresta escura. Nela vagamos e estávamos quase a morrer de fome e fadiga, quando por fim, topamos com uma choupana. Aí morava uma vovozinha, que amigavelmente nos convidou a descansar, tendo ela própria, porém, ido se ocupar do fogão, e não muito tempo depois estava à nossa frente a omelete de amoras. Mal tinha levado à boca o primeiro bocado, senti-me maravilhosamente consolado, e uma esperança brotou em meu coração. Naqueles dias eu era muito criança e por muito tempo não tornei a pensar no benefício daquela comida deliciosa. Quando mais tarde mandei procurá-la por todo o reino, não se achou nem a velha nem qualquer outra pessoa que soubesse preparar a omelete de amoras. Se cumprires este meu último desejo, farei de ti meu genro e herdeiro de meu reino. Mas, se não contentares, então deverás morrer. - Então o cozinheiro disse: Majestade, podeis chamar logo o carrasco. Pois na verdade, conheço o segredo da omelete de amoras e todos os ingredientes, desde o trivial agrião até o nobre tomilho. Sem dúvida, conheço o verso que se deve recitar ao bater os ovos e sei que o batedor feito de madeira de buxo deve ser sempre girado para a direita de modo que não nos tire, por fim, a recompensa de todo o esforço. Contudo, ó rei, terei de morrer. Pois apesar disso, minha omelete não vos agradará ao paladar. Pois como haveria eu de temperá-la com tudo aquilo que, naquela época, nela desfrutastes: o perigo da batalha e a vigilância do perseguido, o calor do fogo e a doçura do descanso, o presente exótico e o futuro obscuro. - Assim falou o cozinheiro. O rei, porém, calou um momento e não muito tempo depois deve tê-lo destituído de seu serviço, rico e carregado de presentes.

Walter Benjamin - Obras Escolhidas vol II - Rua de Mão Única -Editora Brasiliense

Colhendo amoras no alto da escada com a copa carregada de frutos, lembrei da sensação amor a primeira vista quando estava escolhendo a casa onde ia morar e topo com a amoreira frondosa no jardim dos fundos. Sem ver o resto do imóvel, já sabia que era nesse lugar que queria ficar.

Lembrei do presente que foi a primeira colheita, que segundo conta meu vizinho oriental, só se deu no ano em que me mudei para a casa. Quanta geléia, sorvete, doce e até omelete rendeu! E quantas outras delícias se renovam a cada ano, compartilhadas com amigos e familiares!

Ainda recordei de quando estava triste tempos atrás com o fato de ter chegado em casa e encontrado a porta arrombada e pertences levados e a sábia Monique Deheinzelin me pergunta: "Adri, os ladrões levaram a sua amoreira?" Sorri internamente, como um brinde à vida.

Um comentário:

  1. Que linda história, quanta sabedoria e sensibilidade!
    Adorei seu Blog, vou te seguir...
    bjs

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